domingo, maio 04, 2008


A todas as mães em geral e à minha em particular...
Deixei-to há anos, neste dia da mãe, debaixo do guardanapo
=)

POEMA À MÃE
*
No mais fundo de ti,
eu sei que traí, mãe!
*
Tudo porque já não sou
o retrato adormecido
no fundo dos teus olhos!
*
Tudo porque tu ignoras
que há leitos onde o frio não se
demora e noites rumorosas de águas matinais!
*
Por isso, às vezes, as palavras que te digo
são duras, mãe,
e o nosso amor é infeliz.
*
Tudo porque perdi as rosas brancas
que apertava junto ao coração
no retrato da moldura!
*
Se soubesses como ainda amo as rosas,
talvez não enchesses as horas de pesadelos...
*
Mas tu esqueceste muita coisa!
Esqueceste que as minhas pernas cresceram,
que todo o meu corpo cresceu,
e até o meu coração
ficou enorme, mãe!
*
Olha - queres ouvir-me? -,
às vezes ainda sou o menino
que adormeceu nos teus olhos;
*
ainda aperto contra o coração
rosas tão brancas
como as que tens na moldura;
*
ainda oiço a tua voz:
"Era uma vez uma princesa
no meio de um laranjal..."
*
Mas - tu sabes! - a noite é enorme
e todo o meu corpo cresceu...
*
Eu saí da moldura,
dei às aves os meus olhos a beber.
*
Não me esqueci de nada, mãe.
Guardo a tua voz dentro de mim.
E deixo-te as rosas...
*
Eugénio de Andrade

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